7.2.08

GATO NO SOFÁ IX


A FRASE
To die leaving a multi-million-dollar global business empire is an achievement. To do so while countless devotees still regard you as a spiritual leader is about as likely as Yogic flying. The Maharishi Mahesh Yogi, guru to the Beatles, pulled it off.
Editorial do “Financial Times”, 7 Fevereiro 2008

Arquitectura do poder
As cidades modernas são um cruzamento entre o sonho arquitectónico de Le Corbusier e alguns outros grandes mestres do sonho urbano no início do século XX e as cidades que resultaram das pressões políticas, económicas, sociais e tecnológicas. Hoje os homens de negócios têm muito mais importância na definição das cidades do presente e do futuro do que os políticos (vejam-se as cidades-estados de Singapura ou Dubai, centros políticos da globalização económica, que podem viver contratando tudo o que necessitam e vendendo todos os serviços a sociedades de todos os continentes). Como dizia o director do Museu do Desenho de Londres, Deyan Sudjic, “os arquitectos são os políticos mais rápidos. Ainda que existam alguns que são tontos. Todos os políticos buscam o efeito Guggenheim”. Gosto de arquitectura e de perceber como podem ser construídos os símbolos culturais e políticos do futuro. Cada arquitecto, cada responsável técnico pelo sonho, revela no que fica concretizado, um sonho ideológico de deixar a sua marca no futuro. Por isso, imune à polémica sobre se José Sócrates tinha ou não assinado por outros vários projectos na região da Covilhã, fui ver as fotos das casas. Para perceber a dimensão ideológica do sonho de Sócrates. O que vi não me pareceu uma ideologia concreta. Apenas um catálogo de ideias dispersas, confusas e sem sentido. Não havia ali nenhum “efeito Guggenheim” que um dia pudesse ter transposto para a política. Parece-me, ao olhar para o percurso técnico de Sócrates, que são os homens que mandaram construir as casas, que definem o território. Sócrates alinhavou a técnica. A ideologia era-lhe alheia. E ontem, como hoje, a arquitectura do poder não nasce do sonho do político.

As dúvidas de Alípio
Ao dizer que houve “precipitação” quando se constituíram os pais de Maddie como arguidos, o director nacional da PJ, Alípio Ribeiro, mostrou que tem mais dúvidas do que certezas no caso. Mas, palavras como esta, na sua aparente simplicidade, são gasolina na fogueira que alguma imprensa britânica, bem oleada por uma infatigável máquina de comunicação, foi alimentando durante meses: que a PJ era incompetente, que a justiça portuguesa era uma ficção. A dúvida de Alípio tornou-se a certeza da propaganda britânica. Depois desta frase o editor do “News of the World” deve estar a rir como se estivesse a ver um filme dos Monty Python. Acredito que o director da PJ não durma tranquilo com as suas dúvidas. Agora quando diz que o responsável das investigações, Gonçalo Amaral, foi afastado porque “fez declarações que não se devem fazer naquele contexto”, apenas se pergunta: o director da PJ, ao fazer estas declarações, que enterram a justiça portuguesa aos olhos estrangeiros, deveria ser libertado das suas funções pelo ministro da Justiça ou deveria, sem precipitação, ter pedido para ir para casa descansar?

Sarkozy, o Estado e a Europa
Para quem o quer ouvir, Nicolas Sarkozy, mostra que está, a pouco e pouco, a criar uma França diferente, mais interventiva internacionalmente (não é por acaso que deixa no ar a possibilidade de uma intervenção militar unilateral no Chade), mas também com maior papel estatal. O que ele pensa, é o que muitos europeus começam a magicar: querem um Estado mais forte. Há dias Sarkozy disse, sem que se estivesse à espera, que o Estado deve intervir nas empresas e na economia, não tendo de ter uma posição neutra. Muitos viram aqui uma deslocação do eixo de pensamento central da UE, mas se olharmos para o caso da Société Générale, há muito a iluminar a ideologia neo-estatista de Sarkozy. O “rogue trader” Jérôme Kerviel, basta ler a imprensa francesa, está a tornar-se um herói popular. Até porque ele “veio de baixo” e o que fazia não era, aparentemente, para garantir recompensas financeiras para si. Há algo de muito curioso na França: por um lado sempre bebeu, fascinada, toda a cultura popular americana (do jazz aos McDonalds) mas por outro não quer nada com o capitalismo anglo-saxónico.

Reler António Vieira
O Padre António Vieira tinha um sonho optimista para Portugal. O passado tinha sido grandioso, o futuro seria maior, acreditava ele, embora alertasse para as nuvens colocadas por homens que tinham desígnios mais sombrios. Na bela “História do Futuro” escreve, por exemplo, que: “Naqueles ditosos tempos (mas menos ditosos que os futuros) nenhuma cousa se lia no Mundo senão as navegações e conquistas de Portugueses. Esta história era o silêncio de todas as historias. Os inimigos liam nela suas ruínas, os êmulos suas invejas e só Portugal suas glórias. Tal é a História, Portugueses, que vos presento, e por isso na língua vossa”. Nasceu há 400 anos e merece ser relido e sublinhado. Pelo sonho mas, também, pelo prazer da escrita.

Sons da memória
O último disco de Yasmin Levy, “Mano Suave”, é uma das mais belas pinturas sonoras que escutei nos últimos tempos. A jovem israelita foi buscar à comunidade Ladino (judeus que têm origem em Portugal e Espanha, e que foram para o exílio) grande parte das canções que interpreta. Yasmin mistura as canções tradicionais destes exilados judeus com o som do flamenco. Para ela tudo é mais do que uma linguagem única (falada talvez por 100 mil pessoas) mas sim de uma forma de vida. Mas do que isso, neste disco encontram-se influências da música turca e árabe. E Jerusalém, como pólo de três religiões (cristã, judaica e muçulmana) está a pairar por aqui. Para ouvir muitas vezes.

Ilustrações de ouro
O último número da “Vanity Fair” é dedicado a Hollywood, com uma bela capa de Annie Leibowitz com as “fresh faces”. Mas, no interior, traz um texto com uma colecção de ilustrações antigas da época de ouro do cinema. Como o que reproduzimos. Apetece aumentá-los e fazer quadros.


31.1.08

GATO AOS PULOS VIII


Water is…the oil of the 21st century.
Andrew Liveris, “chairman” da Dow Chemical, em Davos, Financial Times, 29 de Janeiro

A remodelação camaleónica
O que é que lucra um homem chegar ao pico de uma montanha se, depois, não consegue descer? O recentemente falecido Sir Edmund Hillary, sobre o assunto, dizia eloquentemente: “Eu, pessoalmente, inclino-me a pensar que é bastante importante o poder descer do cimo”. Subir ao pico (do poder, da arrogância, do dever cumprido) pode ter sido o sonho de José Sócrates quando foi eleito. Saber descer à realidade parece ser, neste momento, o seu choque frontal com o clamor da sociedade. Quando remove Correia de Campos ou Isabel Pires de Lima do Governo, Sócrates pratica um novo princípio político: a doutrina camaleónica. É a “terceira via” do Governo que descobriu que tem de governar para a “rua” e não para os gabinetes de técnicos (por muito que isso custe ao ideólogo Vital Moreira). Correia de Campos estava a impor a sua doutrina, mas nunca a faria se não tivesse o aval de Sócrates. Isabel Pires de Lima tinha instituído o imobilismo como política cultural, para pena de quem ainda sonha com o D. Sebastião, vulgo Manuel Maria Carrilho. Sócrates, ao mudar de ministro da Saúde, tem de mudar de política. Não se atira um ministro para o fuzilamento sumário se, das duas uma: ou se está a resguardar a ele próprio, imolando o cordeiro para salvar a própria pele, ou quer calar a maioria silenciosa do próprio PS, para ela não cair na tentação de seguir Alegre ou Seguro num futuro próximo. Quanto à Cultura, a história é outra: Sócrates vai buscar um gestor inteligente, que pode agradar para já à esquerda festiva, mas que sabe o rigor das contas e o valor de dividir o cheque pelos privados. Viu-se o discurso: “fazer mais com menos”. Sócrates chegou ao pico, refugiou-se demasiado tempo numa reclusão míope, mas começa a descobrir que o clamor da rua pode custar umas eleições. Nada como mudar para que tudo fique mais ou menos na mesma.

Das denúncias
Em Portugal há mais denúncias do que investigações e mais destas do que conclusões. Da mesma forma que há mais arquivamentos do que trânsitos em julgado. Tem tudo a ver com o optimismo nacional. O grito do Ipiranga de Monteiro Pinto vai rigorosamente para o cesto dos papéis arquivados. Como o próprio sabe. Ou, pelo menos, já arquivou na sua memória.

As verdadeiras questões de Davos
Muito se tem falado de Davos, do que se debateu e do que ficou nas entrelinhas do encontro onde vão os pesos-pesados da política e da finança. Depois de, no ano passado, se terem anunciado os novos tempos trazidos pela globalização, este foi um ano de vacas magras. A recessão bateu à porta e o mercado financeiro global tornou-se uma colecção de bonecas Matrioshka russas: ninguém sabe que mistério surge quando se tira uma delas. Talvez o texto que defina, com rigor, os desafios que se deparam às sociedades actuais, esteja no “Financial Times” e é assinado por Gideon Rachman. Em suma ele diz uma coisa: enquanto os financeiros estão assustados, os políticos estiveram mais livres para tentar perceber as consequências da globalização. E não estão a ficar muito bem dispostos com o que está a acontecer no topo inferior da pirâmide. Os custos da comida e da energia estão a subir, a água está a escassear. Como se isso não bastasse o clima está a mudar. E, diz Rachman, a busca de alternativas ao petróleo levou aos biocompustíveis feitos a partir do milho. Este, utilizado na alimentação, foi desviado para ali. Os biocombustíveis necessitam de muita água e com a necessidade de terras para mais comida, estão a devastar-se as florestas (a começar pelo Brasil). Os preços da comida e da energia estão a subir assustadoramente e quem mais sente isso são os que estão no topo inferior da pirâmide. Os políticos começam a ver manifestações da Indonésia e no México. E, como se não bastasse, as riquezas de petróleo e do gás no Árctico estão a levar a movimentações militares de diversas potências. O mundo está perigoso e só em Portugal é que não se repara nisso. O optimismo reina por aqui.

Disco de gatinha
É um disquinho delicioso o de Cat Power. Chama-se “Jukebox” e como o nome indica traz uma série de versões de grandes temas. De Sinatra, de James Brown, de Bob Dylan, de Joni Mitchell e de tantos outros. Cat, voz de seda num coração de gato, dá novas vidas às canções de sempre. Para cantar com ela.

Surpresa alentejana
Do Alentejo surge-nos o pujante Branca de Almeida 2004 (da Herdade dos Coelheiros) um néctar regional feito à base das castas Merlot, Alicante Bouchet e Trincadeira. Um belo aroma (a frutos vermelhos) faz, desde logo, prometer o melhor. E isso acontece, neste vinho com uma boa estrutura que indicia uma vida interessante e pode acompanhar carnes poderosas. Um bom trabalho do já conhecido enólogo António Saramago. Refira-se um pormenor não pouco importante: a ilustração do rótulo é de Bela Silva. De aplaudir.

O regresso de Serge Clerc
Foi um dos grandes ilustradores da época de ouro da pop nos anos 80. Os seus desenhos vinham na “Metal Hurlant”, na “Rock & Folk”, no “New Musical Express”. Mas também nas capas dos discos de Carmel, de Joe Jackson, dos Comateens. Depois desapareceu. Voltou agora com um livro superior, “Le Journal”. Depois de um longo silêncio (que, em entrevista à “Inrockuptibles”, descreve como “eu tive medo da minha vida”), os seus desenhos voltam. Puros.


24.1.08

GATO NO SOFÁ VII

A FRASE
Globalisation allowed the US to suck up the savings of the rest of the world and consume more than it produced.
George Soros, Financial Times, 23 de Janeiro

A loja de gelados e os EUA
Na série Seinfeld há uma cena memorável. Uma loja de gelados começa a fazer sucesso com sorvetes “light”. As filas são enormes porque aquele produto não engorda. Seinfeld desconfia, manda analisar os gelados e chega-se à conclusão que tinha 40% de gordura e, portanto, era uma falsificação. Seinfeld denuncia a loja de gelados e aí acontece o que não se esperava – os clientes obesos revoltam-se contra ele porque arruinaram a sua felicidade. Se olharmos para a crise despoletada pelo “subprime”, descortinaremos que a felicidade da gordura americana (e não estamos a falar do seu insaciável apetite pela “fast-food”) se baseava em axiomas deslocados da realidade. George Soros foi cruel, ao dizer que os EUA viviam do que o resto do mundo poupava e consumiam acima do que produziam. Como se fossem uma espécie de aristocratas com problemas de crédito. Mas isso era derivado da sua moeda, o dólar, ser a moeda de reserva internacional. Quando essa expansão de crédito causava tempestades, as autoridades centrais injectavam liquidez e estimulavam a economia por outros meios. O próprio coração do sistema financeiro – baseado na circulação interbancária, a começar pelo empréstimo – entrou em colapso. E os perigos de recessão (e inflação) nos EUA estão aí a bater à porta. Não é por acaso que Joaquin Almunia dava uma estocada letal no inchaço americano: “Não é sobre uma recessão global. É sobre uma recessão nos EUA (…) com o seu défice corrente, com o seu défice fiscal e a falta de poupanças”. Mas não deixa de ser curioso como a crise é vista das capitais dos mercados emergentes. Na terça-feira, num debate do canal Aljazeera, um dos intervenientes dizia que nesses países se separava cada vez mais a globalização em duas áreas: o comércio global é bom, mas a finança global não é tão boa assim. Quem falava assim estava em Nova Delhi.

A piada popular
O inspector-geral da ASAE foi à Assembleia da República dizer que apenas cumpre ordens. Imaginava-se que as ideias não viessem da sua cabeça. Ele é apenas um funcionário que faz com que quem pense (algures em São Bento, talvez em Bruxelas, presume-se que em Marte) possa dormir descansado porque a imoralidade não passará em Portugal. O inspector-geral diz que a sua afirmação de que metade dos restaurantes portugueses deveriam, ou poderiam, fechar, “não foi feliz”. Efectivamente toda a acção da ASAE não tem sido feliz. Mesmo que contratassem os célebres “senhor Feliz e senhor Contente” dos gloriosos tempos de Nicolau Breyner e Herman José, não conseguiria ser. A ASAE espalhou o medo. E isso é tudo o que não se deve ter numa democracia. Não é por acaso que Cavaco Silva, na cozinha conventual do Mosteiro de Arouca, deixou cair a piada: “E então, a ASAE ainda não veio cá”? É este o estado da ASAE neste país: passou de entidade pública a anedota privada.

Diferentes…
José Sócrates e o ministro Mário Lino disseram que só tiveram conhecimento do documento do LNEC a 9 de Janeiro. O presidente do LNEC diz que o Governo conhecia as conclusões desde 19 de Dezembro. Lá Sócrates terá de vir dizer como quando mostrou matematicamente que o Tratado de Lisboa era diferente do anterior Tratado europeu e por isso não era preciso referendar, conforme tinha sido promessa do PS: um era uma coisa, e o outro era outra coisa. Igual, mas diferente. Aqui é o mesmo: um era conclusões, o outro é um documento. Diferentes…

Plenitude musical
É um disco surpreendente. A beleza de “À Deriva” (CD Lisboa Records) dos Novembro, uma banda lisboeta de Miguel Filipe, transborda para todos os sentidos. Deixa-nos ser envolvidos numa cortina sonora de seda, onde todos os sentidos são postos à prova. Há um curioso choque urbano no disco que, por exemplo, é dado pelo confronto entre a guitarra portuguesa e a guitarra eléctrica. Mas todo esse sentimento tem a ver com a própria lógica do ruído urbano e do seu pretérito equilíbrio com a memória portuguesa que continua a navegar por aqui. Este é um disco que marca o ano. E que marca a nova Lisboa.

A imagem dos vinhos
Os vinhos são elementos fundamentais da cultura portuguesa. Preservar o que o seu aroma e paladar transmite da nossa memória é essencial. Mas nem por isso deixa de, numa época de comércio global, saber jogar com a imagem e a comunicação sem fronteiras. É por isso que é muito interessante ir ao site www.quintadoscarvalhais.eu ver alguns dos néctares que se produzem no Dão. Está lá tudo: a vida e a imagem. Para saber escolher. Do Duque de Viseu ao Encruzado estão lá todos os vinhos que se abrigam debaixo da mesma capa de segredos. A descobrir.

Recordar o Vietnam
Um livro que ultrapassa muito a dimensão da chamada “literatura de guerra” é “Tree of Smoke” de Denis Johnson. É uma obra esmagadora sobre a inteligência (dos seres humanos e sobre a “comunidade da inteligência”, ou seja, os serviços secretos de informação), percorrendo paulatinamente os anos entre a morte de John F. Kennedy e 1970. É um livro sobre os segredos sinistros da guerra, sobre os desejos de um coronel que quer enviar relatórios distorcidos, para que tudo acabe numa “tree of smoke”, que é como quem diz, num cogumelo em forma de nuvem nuclear. Um livro tremendo que deveria ser editado em Portugal.

17.1.08

GATO NO SOFÁ VI


A FRASE

Um dia, estaremos sentados em Nova Iorque e o cirurgião estará a fazer a cirurgia (em nós) a partir da costa oeste.
Bill Weldon, director executivo da Johnson & Johnson, Financial Times, 14 de Janeiro


Peggy Sue e o Estado Europeu
Peggy Sue é uma vaquinha americana. Tem uma diferença das outras. É clonada. É a Dolly das vaquinhas. A Food and Drug Administration americana acha que a carninha das vacas clonadas é óptima. Os europeus desconfiam, apesar das certezas dadas. A Europa comunitária vive um momento de realinhamento ideológico, onde os modelos económicos alemães e a perspectiva da economia de mercado comandada pelo Estado, de Sarkozy, parecem estar a triunfar. Isso tem a ver, também, com o regresso da ideologia do “capitalismo de Estado” (que, de uma forma desastrada, Sócrates está a tentar implementar em Portugal – afinal na China o Estado também controla os Bancos…). As regulações da “segurança” dos produtos e das actividades pessoais mostra como esse conceito está de volta através não da “terceira via”, mas de pessoas aparentemente tão estranhas ideologicamente como Sarkozy. É um tema extremamente aliciante.

Sarkozy e a paixão europeia
No seu álbum “Quelqu’un m’a dit”, Carla Bruni canta: “Il faudrait que tout le monde réclame,/Auprés des autorités,/Une loi contre toute notre indifférence,/Que personne ne soit oublié ». A França, e claro, Carla e Sarkozy vivem momentos de paixão. Mas há a componente política do novo idílio gaulês. A França vai presidir à União Europeia a partir de Julho e, por certo, vai tentar fazer vingar a sua concepção do que deve ser a nova Europa. Sarkozy descobriu o novo amor e também descobriu a África, e é por isso que cada vez mais fala de uma União Mediterrânica, juntando a UE aos países do norte de África. Em Portugal, claro, nenhum político discute o tema mas Ângela Merkel não morre de amores pela questão, assim como não está muito virada para a ideia de Sarkozy de limitar a independência do Banco Central Europeu. Mas um novo centro europeu está a ser construído. E Portugal não o discute.

A Posição
Sócrates continua impávido e sereno. Quando se começava a falar da razão porque não havia um referendo por causa do chamado Tratado de Lisboa, a atenção virou-se para outro lado, porque o Governo decidiu aterrar em Alcochete. Quando este tema começou a chamuscar, as atenções foram viradas para o BCP. É o que se chama gerir a informação e jogar com a oposição com a célebre política da cenoura e da marreta. A oposição segue a cenoura, leva com a marreta e Sócrates prepara calmamente a reeleição.

A Oposição
O PSD opõe-se ao Governo da mesma forma que Homer Simpson compra vinho: compra o segundo menos caro da lista. Não cria factos políticos, vai atrás dos saldos do Governo. Menezes parece um Zeppelin a perder altura e já só se começa a preocupar com a oposição interna. A sua célebre oposição começou com apoios ao Governo (sobre o referendo) e com dislates (pedir alguém do PSD para a CGD). A aliança de Menezes com Santana Lopes não é, para Sócrates, o “eixo do mal”: é o “eixo do medo”.

A justiça ecológica
Um dos mais deliciosos livros que li nos últimos meses foi “Dos Delitos e das Penas”, de Cesare Beccaria, escrito em 1776. É uma obra que discute o âmago do Direito Penal e as mais vastas relações do Estado com os cidadãos. No admirável texto que nos ofereceu, e que em muitas coisas continua a ser actual, escreveu por exemplo: “Que espécie de governo é aquele onde quem reina suspeita em todo o seu súbdito um inimigo e é constrangido, em nome da tranquilidade pública, a retirar a tranquilidade a cada um”? Não deixo de pensar nesta singela frase quando penso na decisão do STA que permite a co-incineração na Arrábida (um valor ecológico único na Península Ibérica) e se ignora em termos de qualidade de vida do país esta questão e, pelo contrário, o que causa dor de cabeça a muitos “ecologistas” de pacotilha é o estudo de impacte ambiental de Alcochete. Isto para já não falar do estado cerceador das liberdades individuais que está a ser criado em nome da saúde e do politicamente correcto aos olhos de Bruxelas e de São Bento.

Europa unida?
Uma das mais interessantes revistas da actualidade, a “Prospect” inclui no último número um interessante texto sobre a nova geração de irlandeses, que enriqueceu depois da entrada na UE. Lembram-se daquele país que era mais pobre do que Portugal e que, entretanto, cresceu, cresceu, cresceu? No número de Janeiro é de ler a coluna “Brussels Diary”, sobre a campanha para a presidência da UE. O lugar para o qual Blair se queria candidatar. Mas ele estava ao lado de Bush, de Aznar e de Durão Barroso. Corrosivas as palavras citadas de um deputado europeu: “Aznar já se foi, Bush está a ir e não podemos ter os outros dois a governar a Europa”.

Chloé feliz
Morrissey, um dia, cantou: “Hang the DJ”. Estava equivocado. Porque os DJs tornaram-se o centro nevrálgico dos novos universos da música. Chloé é um exemplo perfeito disso. Escute-se o seu novo disco, “The Waiting Room”. A DJ francesa junta nele a house e música folk e todo o ambiente fica imerso numa constelação de constelações sonoros capazes de nos tornarem felizes. Talvez felicidade seja o tema certo para o que sentimentos depois de escutar os sons que nos oferece.

Olhá sardinha viva!
Foi uma surpresa. Deliciei-me, há dias, com uma lata de conserva com cravinho. De uma marca que desconhecia, La Gôndola, de Matosinhos. Trata-se de um produto que existe noutras variantes, por exemplo sardinhas em azeite biológico ou com limão, e que são feitas com base numa campanha, sendo a produção apenas assegurada entre Junho e Novembro. As que agora chegaram às lojas Gourmet são da campanha de 2007. E são deliciosas.





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10.1.08

GATO NO SOFÁ V


A FRASE

“Prefiro pensar que um dia a vida será mais justa, que os homens não se olharão a procurar defeitos uns nos outros. Que haverá sempre a ideia de que em todos há um lado bom. Nesse dia, será com prazer que um procurará ajudar o outro”
Oscar Niemeyer, na Folha de S. Paulo

A “comeback kid”
A democracia americana é uma espécie de filme de Disney rodado entre Hollywood e a “última fronteira” do oeste. Um conto de fadas cheio de mistérios e armadilhas. Veja-se o que se está a passar nas primárias. Quando Barack Obama ganhou no Iowa relegando a senhora Clinton para um humilhante terceiro lugar, julgou-se que uma nova página se estava a virar na história presidencial dos EUA. Errado. Jay Leno, no seu programa, definia com humor este estranho mundo eleitoral: “como sabem ‘caucus’ é uma palavra grega que significa ‘o único dia em que alguém dá atenção ao Iowa’”. O exagero é notório, mas como Bill Clinton renasceu em 1992 no Iowa, com um segundo lugar, após ter sido pressionado pelo “caso Jennifer Flowers” e ganhou por isso o epíteto de “comeback kid”, Hillary parece querer seguir os passos do marido. Numa eleição onde o tema é “mudança” (e os EUA vivem assustados com o fantasma da recessão), Obama tem falado dos temas que ferem a América (o aquecimento global, Guantánamo, a relação dos EUA com entidades como a ONU), e Hillary tornou-se mais emocional. Hillary não é uma “fashion victim”: usa calças e há estlistas que dizem que ela, como outrora Margaret Thatcher, veste roupas para mostrar poder e não para parecer “sexy”. Seja como for, no campo democrático, não são apenas as ideias e o dinheiro que fazem ganhar as primárias. São os votos. E, recorde-se, para se ser o candidato presidencial precisa-se de 2025 votos na convenção de Agosto. Mas aos grandes eleitores das primárias juntam-se os chamados “super-delegados”, que são 796 da estrutura do Partido Democrático. E estes, segundo parece, têm poucas dúvidas: Hillary é a “comeback kid” rumo a Washington.

Elementar, meu caro Einstein!
Consta que Einstein, num dia de pouca sorte, deparou-se com uma pequena rebelião dos seus alunos. Num teste surgiram as mesmas questões do ano anterior. Os alunos protestaram, porque essas perguntam deveriam ter dado lugar a outras, novas. Einstein terá olhado calmamente para os discípulos e terá dito: “na verdade, as perguntas são as mesmas. Mas as respostas mudaram”. Sócrates, para defender (com o apoio do PSD) que tudo deveria ser decidido na paz soporífera da AR, veio dizer que este Tratado de Lisboa era diferente do anterior e que, por isso, o PS não estava preso à sua posição eleitoral. Chama-se a isso deitar areia para os olhos dos cidadãos: compreende-se que a classe política europeia tenha receio de que haja um “não” popular e que o Tratado acabe com o “sonho”. Mas seja corajosa e diga-o. E Sócrates deveria ter tido essa coragem e não tentar fazer de David Copperfield dos pobrezinhos de espírito. Clama-se, por fim, que Cavaco Silva pressionou para que o PS tomasse esta decisão. Há uma “nuance” substancial: o PR mostrou claramente uma posição política (deve ser aprovada no Parlamento para que não haja o risco da Europa unida se estilhaçar) e Sócrates fez de mágico amador.

Pimenta na língua!
O senhor secretário de Estado da Segurança Social deu uma notável aula de como leu mal o conceito leninista de “um passo à frente e dois à retaguarda”. Ou então, só leu os “sound bytes”. Disse e, depois, desdisse. Num país civilizado não tinha colocado o lugar à disposição: tinha sido removido do Governo por quem de direito. Argumentar, como fez, que “não seria aceitável que os pensionistas recebessem um valor de pensão qualquer em Janeiro e no mês seguinte o valor do seu recibo de pensão era menor, diminuía”, é de bradar aos céus. Estávamos a falar, em média, de 68 cêntimos por mês. Um preço de uma bica! A dúvida é só uma: ou o senhor secretário não sabia o que estava a dizer ou não disse o que sabia.


Banda sonora deliciosa
É a minha mais recente descoberta para animar as tardes chuvosas: os americanos Clare and the Reasons, com o álbum “The Movie”, estão a trazer de volta a beleza sonora da música sem tempo: baladas cheias de espírito pop e jazz. Com uma imagen da época de ouro da Paris boémia e da América pós-recessão dos anos 30. Simplesmente brilhante.
Farewell Hotel Lisboa
Macau já desapareceu dos nossos sentimentos. É por isso que não deixo de recordar um hotel/casino onde, um dia, fui beber uma Super Bock porque nas “casas de pasto” próximos, como a que se chamava “Carne Assada” só se falava cantonense e se bebia cerveja San Miguel. A sociedade de Stanley Ho anunciou que vai construir um novo hotel/casino no terreno do velho Hotel Lisboa, que abriu as portas em 1970 e era um sinal de uma época que já desapareceu. Mas mudam-se os tempos e as vontades e entretanto chegaram os americanos com os seus casinos e, em Dezembro de 2007, as receitas dos 18 casinos de Stanley Ho ficaram em segundo lugar, após a do Las Vegas Sands. No total o jogo em Macau, durante 2007, gerou uma receita de 7290 milhões de euros. É o fim de uma era…que parecia saída de um filme de Zhang Yimou com Gong Li.

Atenção à Casa Gourmet

É uma proposta muito simpática para quem gosta de produtos “gourmet” e de dar prendas personalizadas onde podem caber chás (como da Mariage Frères ou da portuguesa Gorreana), chocolates (belgas, da Neuhaus), vinhos portugueses e estrangeiros, queijos, azeite, compotas e tantas outras coisas boas. Fica em Guimarães (telefone: 962063159 ou 253516841). Um enorme prazer.

3.1.08

GATO NO SOFÁ IV


A FRASE

“The lesson: in the US, match the markets; in Europe, match the banks”
Michael Hume, do Lehman Brothers, no “Financial Times”


A cigarra e a formiga
Em Portugal a fábula da cigarra e da formiga tem actores designados. José Sócrates faz de cigarra, Cavaco Silva de formiga. Basta comparar os discursos do primeiro-ministro e do Presidente para se perceber o que os divide. E é tudo. Está tudo nos seus discursos de Natal e de Ano Novo. Um está eufórico com o presente, o outro pensa no futuro.


O deserto anunciado
Sócrates e os seus ministros vão continuando a sua saudável política ecológica, desertificando o interior do país. Encerram SAP, fecham escolas primérias, deslocam funcionários estatais para cidades. É assim que, com a desculpa da redução de custos, que se promove um país ecológicamente puro: deslocando os novos do interior, promovendo o envelhecimento das pequenas localidades do interior. Quando o Estado deserta da linha da retaguarda está a dizer a todos (investidores, habitantes…) uma coisa simples: o último que feche a porta! Como é que o Governo quer investimentos no interior se aos quadros oferece “zero” em termos de condições de vida, para eles e para a família? A última teoria da conspiração que ouvi dizia: Sócrates está a ser aliciado por uma quinta coluna dentro do PS para fazer estes dislates. Será verdade?

Com papas e reformas
O Ministerio da Educação tomou uma decisão histórica: as escolas Básicas e Secundárias vão deixar de ter, na sua denominação oficial, nomes de santos ou santas. Como se imagina esta é uma das medidas fundamentais para que o ensino em Portugal deixe de ser a nulidade para onde caminha a passo de corrida… Valha-nos Santa Engracia! Como grande parte das freguesias do país também tem o nome de santos, por certo o Governo legislará brevemente para que estas também deixem de ter essa designação. Consta mesmo que a residência oficial de Sócrates passará, depois de retirado o nome “São”, a chamar-se apenas “Bento”. Será? Afonso Costa, na I República, não conseguiu ir tão longe. Que pensará António Guterres desta “medida fracturante”?


As previsões de Jancis Robinson
Jancis Robinson, no “Financial Times”, escreveu este fim-de-ano, o texto que todos os produtores e consumidores de vinho deveriam ler. É uma aula de sobrevivência para quem gira no mundo do vinho. O preços dos vinhos excelentes subiu exponencialmente (devido à procura dos clientes endinheirados da Ásia e do Leste europeu e ao surgimento de fundos internacionais de investimento em vinhos). Para Robinson 2007 terá sido o último ano dos preços de mercado masificado, até porque a subida do euro e o decréscimo da produção australiana levou a que os preços dos vinhos outrora baratos subisse substancialmente nos Estados Unidos. A França, por outro lado, regressou em força, com bons vinhos a preços interessantes. Para além disso Robinson acende as luzes do futuro próximo: o aquecimento global do planeta está a levar a que os vinhos tenham níveis alcoólicos mais altos e a cada vez mais notória falta de água em certas regiões será um problema grave. A ler e sublinhar. Para que não se admitam distrações.

Propostas vínicolas
Duas propostas vinícolas para o ano de 2008: o Branco da Herdade da Calada, feito à base das castas Verdelho e Roupeiro, é um vinho já a pensar nos dias mais quentes e que combina bem com muitos pratos alentejanos; a Herdade da Comporta também nos traz belos vinhos, tintos e brancos (bem tentador o da colheita de 2006), capazes de nos tentarem pela sua singular qualidade típica de uma zona vinícola que muitas vezes é esquecida.

Sopa de letras e sons
O ano de 2007 trouxe-me bons livros e bons discos (e alguns já tinham sido editados em anos anteriores). Para iluminar a mente e o corpo nos dias de deserto da política nacional.
Os discos:
St Vincent, com “Marry Me”, uma americana (Annie Clark) com um disco notable. As letras são verdadeiro ácido (as mulheres oiçam “Now Now”, por ejemplo) e o som é ora puro ora agreste. O meu disco do ano.
Au Revoir Simone com “The Bird of Music”, um encontro na Terra entre a pop e as vozes dos anjos, numa reminiscência de Virginia Astley e Young Marble Giants. Divino.
Tinariwen com “Aman Iman”, a rádio global que se escuta no deserto do Sahara.
Robert Wyatt, com “Comicopera”, a beleza de uma voz, ao serviço do internacionalismo na época da globalização. Por isso, para além de cantar em inglês, Wyatt canta em espanhol e italiano.
Bruce Springsteen, com “Magic”, um disco desprezado por muitos que, lamentablemente, não sabem o que o rock ainda tem de bom.
Clã, com “Cintura”, mais uma singular aventura de um dos melhores grupos de pop/rock nacionais da actualidade. Dizem-me que o concerto em Lisboa foi memoráve com o regresso das guitarras destorcidas, num ambiente quase “punk”. Irei vê-los quando voltarem.
Buraka Som Sistema e o inigualável “From Buraka to the World”. O novo Portugal em acção.
Mayra Andrade, com “Navega”, com Cabo Verde por fundo, uma voz maravillosa que abriu as portas do som do mundo.
Jerome Attal, com “Comme Elle se Donne”, a nova pop refrescante francesa.
Gabriela Montero, com todos os seus discos inovadores na música clássica.

Os livros
José Eduardo Agualusa, “As Mulheres do meu Pai” (Dom Quixote)
Raymond Aron, “Memórias” (Guerra & Paz)
Ivo Andric, “A Ponte sobre o Drina” (Cavalo de Ferro)
Maria Filomena Mónica, “Cesário Verde” (Aletheia)
António Tomás, “O Fazedor de Utopias” (Tinta da China)
Dino Buzzati, “Pânico no Scala” (Cavalo de Ferro)
John Gray, “Black Mass” (Penguin/Allen Lane)
Cesare Beccaria, “Dos Delitos e das Penas” (Gulbenkian)
Jon Savage, “Teenage: the criation of Youth 1875-1945” (Chatto & Windus)


Oriente sedutor
A revista “Oriente”, da Fundação Oriente, continua a ser um verdadeiro oásis para percebermos melhor as inúmeras ligações de Portugal ao mundo fascinante que hoje é um dos motores económicos do planeta. O número 18 inclui textos que merecem ser lidos com atenção, até porque em Portugal se esquece, com muita facilidade, as lições da História. As relações do nosso país com o Sri Lanka ou a “iconografía de fortalezas portuguesas na região do Golfo Pérsico por volta de 1600”, de Rui Manuel Loureiro, merecem destaque.

27.12.07

GATO NO SOFÁ III


A FRASE

“Os americanos e os europeus (…) compreenderam que se os chineses vêm de tão longe para trabalhar na África, emprestar-lhe dinheiro, comprar e vender mercadorias, eles encontram um interesse que eles mesmos tinham subestimado. Como é evidente, este continente ‘vale’ alguma coisa. E depois dos chineses terem vindo para África, a Índia e o Brasil procuram fazer o mesmo, os EUA preocupam-se por estar cada vez mais presentes, como a Alemanha e a EU”
Béchir Bem Yahmed, fundador do grupo “Jeune afrique”, na “La Revue”, nov/dez 2007-12-26

O Estado e a sociedade civil
Portugal nunca teve o Rei Sol, mas Sócrates está a ver se consegue ser o “primeiro-ministro micro-ondas”, tão quente é na defesa do conceito do “Estado sou eu”! O discurso de Natal foi a mais desvanecedora massagem ao próprio umbigo que me lembro ouvir. Até não se poupou dizer que quase não dormia por causa dos desempregados e que o défice estava controlado. Como? Por o Estado ter apertado o cinto? Não. Porque os impostos garantiram mais impostos. Apetece sempre citar Eça de Queiroz: “Temos um défice de 5000 contos. Esta é a negra, a terrível, a assustadora verdade. Quem o promoveu? Quem o criou? De que desperdícios incalculáveis se formou? Como cresceu? Quem o alarga? É o governo? Foram os homens que combatem, foram aqueles que defendem, foram aqueles que estão mudos? Não. Não foi ninguém”. Isto escreveu Eça em 1867. Estamos em 2007. O que mudou? É o contribuinte que paga o desaforo.

Um exemplo
O SNS é um buraco negro. Para pagar as dívidas, pede dinheiro ao Estado. Para pagar ao Estado, no fim do ano, pede à banca. No início do ano paga à banca, com juros. Para voltar a ter dinheiro, volta a pedir ao Estado. E vai alargando o buraco. Não sou eu que diz. É o Tribunal de Contas? Será que é isso que preocupa Sócrates no Natal?

A GRALHA DA GAFFE
O ministro da Administração Interna, Rui Pereira, deu uma entrevista ao jornal do PS, o “Acção Socialista”. É normal. Segundo parece o ministro referiu que o problema da criminalidade da noite do Porto não é “real”. O alvoroço estalou e os profissionais da má-língua dispararam sobre o ministro que fez um tirocínio breve pelo Tribunal Constitucional antes de ceder ao canto da sereia do Governo. Mas era uma maldade! Não é que, esclarece o ministro, não foi isso que ele disse ao órgão oficial do PS: foi uma gralha. O que o ministro Pereira terá dito é que o problema não é “geral”, esclareceu o próprio. Não se compreende: segundo o ministro Pereira a culpa de tudo é da “mediatização”, dos jornais e televisões, portanto. Mas será que há uma quinta coluna no órgão oficial do PS, que é o partido do Governo? Nem em casa o ministro Pereira escapa às maléficas actividades dos “media”…

Pássaros no Campo das Cebolas
Há dias dei por mim a andar junto do Campo das Cebolas. Ouvi o chilrear e olhei para as palmeiras que resistem ao betão e às obras do “seguríssimo” Metro do Terreiro do Paço. Milhares de pássaros conviviam uns com os outros, criando momentos únicos de prazer na cidade do “stress” e do ruído. Ainda há coisas bonitas em Lisboa. Que nos fazem acreditar nesta cidade.


Chineses sem Chinatown
Descobri, ao pé de mim, uma nova loja chinesa. Não é de produtos desconhecidos. É de legumes e frutas. Frescos. E extremamente baratos. São adquiridos no mesmo local onde os outros comerciantes compram mas os preços rondam entre a metade e os 2/3 do que custam noutras mercearias ou supermercados. Está sempre cheio. Temo que a ASAE passe por lá.

Millennium sempre!
Não, não tem nada a ver com a crise da maior instituição financeira privada portuguesa. A crise, aqui, é outra: tem a ver com a da sociedade. “Millennium” foi uma série de Chris Carter, que devia algo a “Profiler”, sobre um agente reformado do FBI, Frank Black, que tem o dom de “ver” o que pensam os “serial killers” com que tem de se deparar. A primeira temporada saiu agora em DVD no nosso país. E é um prazer.

VINHOS SENSATOS
Há vinhos que merecem ficar num trono: os Portos por exemplo. Que dizer do Late Bottled Vintage 2001 da Graham’s? Um néctar de tal maneira agradável e de uma leveza única que é impossível ficar indiferente a ele. Na noite de Natal todos o elogiaram.
E há o Quinta da Ervamoira Vintage 2005. Outro grande vinho do Douro para adoçar longas noites de conversa. Elegante e cuja cor faz-nos lembra o outro lado do mundo: o secreto, o Nero, o qu não se vê. Só se sente.

Há culpados?
“A Culpa dos McCann” (ed. Guerra & Paz) é uma bem estruturada obra de Manuel Catarino sobre o caso Maddie, onde há ainda muito mais dúvidas do que certezas. Logo no início explica-se o mistério entre da intriga: “Se o desaparecimento de Maddie fosse a trama de um romance de Agatha Christie, Hercule Poirot teria reunido o casal McCann e os sete amigos britânicos à beira da piscina do Ocean Club - e, de raciocínio em raciocínio, em menos de um fósforo, resolvia o mistério”. Não foi assim. E, lendo-se este livro, percebe-se porquê.
O Anúncio
No “Financial Times” de 21 de Dezembro lá está o anúncio: a Sonangol convida companhias para novas concessões de petróleo em Angola. Para diversos blocos, do “onshore” de Cabinda ao Kwanza “onshore”. As propostas serão abertas a 14 de Março de 2008. Pormenor que não é curioso, mas de sublinhar: as propostas devem ser apresentadas em português ou, se forem feitas noutra língua, devem ter uma versão oficial em português. Entre as 43 operadoras pré-qualificadas lá está a GALP. Com muitos pesos-pesados à volta.

A crónica
Tornei-me um fã das crónicas de Bárbara Reis no “Público”. São incisivas e refrescantes. Sinto que merecia escrever mais do que a sua solitária crónica semanal.